CONSIDERÇÕES
Pouco tempo antes da minha salvação eu era os olhos do mundo e dos demais discípulos a minha volta. Aos olhos de todos, uma tarja de luto flamejante e um cálice de água benta. O velho ancião, cujo semblante suscitava melancolia, acendia os relâmpagos riscando o céu despido de estrelas. Ninguém podia sonhar. Ninguém podia sorrir. Os disfarces, as máscaras eram feitas de pesado metal retirado do útero da terra e cobriam a vergonha de todos. Não havia esperança. Uma singularíssima tristeza recaída sobre as crianças, impedia as orações e os folguedos. As sementes secavam amontoadas pelos quatro cantos sem a possibilidade germinar, impediam a rosa de exalar seu perfume. Os poetas calaram a poesia e o mundo silenciou. O sangue não era vermelho, as veias se prendiam em imensos teares na trama e urdidura dos ossos e o constrangimento dos antepassados era semelhante ao do pássaro que não pôde alçar voo. Uma pedra rolou montanha abaixo abrindo uma ferida por onde enxofre e lava causticante, fizeram um rio. Caim dançou a morte e a redenção, e pássaro azul voou através daquele céu plúmbeo indo pousar no meu coração. Estava consumado.
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