As Borboletas Não Morrem

Minhas férias escolares eram motivo de muita alegria - era a liberdade na fazenda dos meus avós - promessa de longos dias de aventura pelas matas,  os banhos de rio, cavalagadas pelos pastos com o vento no rosto... e a noite, as histórias do meu avô. Era o meu País de Faz de Contas, onde tudo era possível e eu era a princesa soberana de todas as histórias - que mais eu podia querer?!
Meu avô era mestre em contar histórias de lugares distantes, de um povo guerreiro, de princesas de olhos negros e pele de veludo - vovô os meus olhos não são escuros! - Ele respondia sorrindo - "Iaiah, seus olhos tem a cor da areia da dunas"... Foram essas histórias que  povoaram a minha imaginação por anos, e junto com meu avô eu conheci o milagre da vida no nascimento de potros e bezerros, na transformação de flores em frutos, na maturação destes frutos e no surgimento da semente... Pude ver  a mão certeira da morte colhendo suas vítimas e o séquito esfomeado  sobrevoando a espera do banquete. Tudo me foi passado de uma maneira tão doce quanto o mel que colhíamos dos favos e lambuzávamos nossos dedos aproveitando cada gota dessa dádiva de Deus. Ficávamos horas intermináveis deitados na sombra das pitangueiras ouvindo o baque surdo do monjôlo e outras horas mais, olhando os peixes descansando por baixo das ninféias em flor... tudo em perfeita comunhão com o universo pulsante de insetos e pássaros que nos brindavam com sua melodia. Uma tarde meu avô levou-me a um lugar secreto. Um olho dágua!! Uma lágrima da Mãe Terra, pronta para saciar nossa sede. A terra em volta da mina dágua, era úmida e coberta de bambus, taquaras e avencas criando uma  sombra referscante. Foi uma visão do paraíso descortinando-se aos meus olhos...o chão coberto de borboletas. De todas as cores, de todos os tamanhos... Pousadas na areia úmida, desenrolavam sua língua-tromba e sorvendo água para depois voar e pousar mais além. Quando me aproximei, todas voaram. Me senti num carrossel de anjos coloridos que esbarravam em mim, eu tentando pegá-las e meu avô as gargalhadas diziendom: "são fadas, faça o seu pedido Iaiah, um desejo do coração de uma criança pode tudo." Foi então que eu percebi algumas borboletas imóveis no chão - mortas! Não voam mais - mortas! Fiz o meu pedido. Para que as borboletas nunca mais morressem, que fossem voando para o céu e assim ficassem como anjos em nossos sonhos... Muitos já se passaram desde esse dia e talvez hoje meu avô esteja com alguma borboleta pousada em sua mão, como ele fazia..."veja Iaiah, essa veio me dar bom dia".